Um chamado urgente desde Venezuela

A Plataforma Contra o Arco Mineiro do Orinoco, como espaço de articulação de ações dirigidas à anulação do Decreto Nro. 2248 “Arco Mineiro do Orinoco”, torna de público um comunicado tomando posição sobre a atual conjuntura, propondo soluções que apelem à democracia na Constituição vigente (de 1999).

Tradução para URUCUM de Giovanna Marra, o comunicado é de junho de 2017, original do espanhol aqui

O texto dá continuidade a série sobre Venezuela iniciada com texto traduzido aqui

 

Por uma solução democrática e constitucional à crise na Venezuela

Plataforma Contra el Arco Minero del Orinoco

 

Levando em conta a grave situação que atravessa o país, nós da Plataforma contra o Arco Mineiro decidimos pronunciarmos e nos posicionarmos frente fatos importantes da realidade:

  1. O impacto da crise econômica, política e social que atravessa a nação, a profunda ingovernabilidade e instabilidade, o desprestigio da institucionalidade estatal, o desrespeito às leis por parte dos setores de poder e a escassa vontade dos grandes polos (cúpulas: governo-MUD) geraram um perigoso cenário de violência.
  2. A crise é produto do colapso do modelo rentista e presidencialista que se mantêm na Venezuela, o que requer um profundo debate público, transparente, respeitoso e sincero entre todos os setores e atores sociais que tomam parte no país pela construção de outro diálogo distinto. Se não se apresentam soluções a curto, médio e longo prazo, a crise continuará aprofundando-se independentemente de que exista uma mudança de governo ou não.
  3. Consideramos que a única saída para enfrentar esta crise passa por aprofundar a democracia, segundo estabelecido na Constituição da República Bolivariana da Venezuela convocada, elaborada e aprovada pela via da participação popular. Qualquer proposta política por fora do marco constitucional só pode aumentar as tensões e acrescer a violência, piorando o cenário de crise em que padece o povo venezuelano e podendo se tornar em um derramamento de sangue maior ao que já ocorreu.
  4. Rechaçamos contundentemente a violência gerada por grupos extremistas afins aos setores políticos da polarização, grupos armados irregulares diretamente relacionados a setores do governo, e garimpeiros-mercenários relacionados a setores da MUD. Suas ações ocasionaram a morte de mais de 60 venezuelanos/as e centenas de feridos, além de ações de vandalismo e danos ao patrimônio público e privado desenvolvidas por esses últimos, que não tem nada a ver com as manifestações pacíficas e legítimas que desenvolvem outros setores da população. Nem as direções políticas da MUD nem do PSUV se desvincularam categoricamente destes setores, o que expressa sua cumplicidade com a violência e seu vago interesse em buscar soluções pacíficas e democráticas à crise.
  5. Rechaçamos a repressão executada por funcionários dos corpos de segurança do estado (PNB, GNB) e o uso de armas letais contra manifestações pacíficas, assim como os operativos de busca e detenções sem ordem judicial e o julgamento de civis em tribunais militares.
  6. Frente a proposta de Assembleia Nacional Constituinte (ANC) realizada pelo presidente da república, com bases comiciais que apresentam vícios de participação, existem diversas posturas políticas, entre os integrantes da plataforma, com respeito à mesma. No entanto, vemos como determinante que frente dita iniciativa se levem a cabo mecanismos de consulta direta ao povo venezuelano, mediante a realização de: 1) um Referendo Consultivo para a execução ou não da ANC, 2) Referendum Aprobatório ou Abrogatório da proposta elaborada pelos constituintes, em caso de que a população tenha aprovado fazer uma ANC.
  7. A partir do colapso do modelo rentista que atravessa o país e a discussão nacional que implicaria um processo constituinte, que é distinto à uma Assembleia Nacional constituinte em referência aos mecanismos de participação popular, como plataforma cidadã, preocupada pela grave situação que estamos atravessando, apresentamos uma série de problemas estruturais e propostas mínimas para abordá-los:

 

a) Arco Mineiro do Orinoco: contempla um megaprojeto mineiro com 150 empresas transnacionais em uma zona que abarca 12% do território nacional. Uma zona econômica especial, que implica um secionamento da soberania, em que se restringem direitos políticos e sociais contemplados na Constituição, e que colocam em risco populações indígenas, a fonte hídrica mais importante do país, o fornecimento de 70% da eletricidade a nível nacional e toda a biodiversidade que contempla a região da Guiana, devido à ampla destruição social, cultural e natural que implicam as dinâmicas extrativistas das empresas mineiras no Mundo. Propomos: a derrogação do decreto 2248, a proteção de Zonas Virgens do Sul, um diagnóstico das empresas metalúrgicas e mineiras do estado, e uma discussão nacional para debater planos econômicos produtivos.

b) Mineração Ilegal: flagelo que atualmente envolve direta e indiretamente a centenas de milhares de pessoas. Os habitantes das zonas mineiras e pessoas que migram em busca de um maior ingresso, estão submetidos a um regime paraestatal administrado por grupos criminosos que controlam o desenvolvimento da atividade mineira a pequena escala. Esta dinâmica deparou-se em sintomas graves de decomposição social (massacres, fossa comuns), em uma devastação criminosa e contaminação acelerada dos principais rios do Sul, epidemias nacionais de paludismo e difteria, e condições de trabalho escravo para as dezenas de milhares de pessoas que trabalham nas minas a pequena escala. Propomos: um debate nacional entre todos os setores sociais do país e principalmente da região da Guiana sobre esta realidade e as possíveis soluções, a presença das instituições do estado para controlar os índices de violência, um plano de reordenamento territorial e de desmantelamento destes grupos garantindo mecanismos de controladoria cidadã para impedir violações de direitos humanos.

c) Contaminação Ambiental: o governo mantém uma política de silencio criminoso frente aos desastres ambientais que ocorrem continuamente no país, tanto para aqueles casos nos quais o estado é diretamente responsável, assim como em outros nos quais estaria indiretamente implicado. As gigantescas montanhas de coque de petróleo no complexo criogénico Jose Antonio Anzoátegui, os abusos da mineração ilegal, o caso da lagoa de lodos vermelhos de Bauxilum e o derrame petrolífero em Trindade e Tobago que atualmente contamina praias de Anzoátegui, Nova Esparta e Los Roques, são algumas das centenas de casos que vêm denunciando expertos na área ambiental. Propomos: tomar medidas de emergência imediatas para deter a contaminação acentuada que vem se desenvolvendo no pais, considerando as opiniões e propostas de ambientalistas que vêm lutando; assim como acatar o estabelecido na constituições e demais leis da república relacionados al tema.

d) Pagamento sustentado da Dívida Externa: nos últimos 3 anos foram pagos mais de 60.000 milhões de dólares ($) em Dívida Externa, implicando uma redução de mais de 60% das importações (inclui alimentos e medicinas), com respeito ao ano de 2012. Somado à isto, PDVSA vendeu Bônus a Goldman Sachs com um desconto de 60%, recebendo 865 milhões de $ e tendo que pagar a soma de 3556 milhões de $ no ano de 2022. Em outras palavras, o governo vem endividando fraudulentamente ao país à custa de que os venezuelanos tenham menos alimentos e remédios. Propomos: o fim do pagamento da dívida durante um lapso determinado, e realizar uma auditoria pública e cidadã para certificar que parte da dívida é real e que parte é ilegítima e ilegal.

 

É urgente abordar estes assuntos para deter a crise e buscar saídas viáveis ao lamaçal em que se encontra o país. É imprescindível que estes e demais pontos de importância nacional se debatam de maneira aberta, pública e respeitosa com todos os setores da população venezuelana, mais além das dirigências da polarização, o que vem a ser fundamental para avançar em saídas democráticas e pacíficas à crise.