amor, matéria de fim de mundo

 

Lina, amor

te escrevo rápido entre milhares de coisas.
A boa notícia é que deixei meu emprego, entreguei o velho apartamento, dei minha bicicleta.
Já nada me conecta a esse lugar. Me sinto flutuando, exílica. Volto para te encontrar e estarmos juntas.
Estou cheia de ideias, me derretendo de amor e com muito tesão de que façamos tudo que estamos planejando faz tempo em segredo.
Eu quero tudo que você quer, esse desejo me livra dos abismos. Os cartazes; lambes, como você quiser, amor.
O grupo de estudo, leiamos Nietzsche. Dançar; vou voltar a dançar, amor. Nosso filme e as canções que tocam sempre naquela oficina mecânica perto da sua casa.
Te beijar muito, fechar os olhos como fazíamos naquele dia, domingo cedinho enquanto descobríamos uma ruazinha sem saída  cheia de palavras pelos muros.
Suas formas mágicas em que quero voltar a me desfazer enquanto você me chupa e nos entregamos em abraços que descem se transformando em carnaval. E o zine, claro. Ainda é tempo para zines, não?
Mudando de nome em cada número e com fotos de nossos corpos nus, muita revolução molecular, máquinas de guerra, perfumes de flor, minha flor.
E queria que o zine tivesse seu cheiro. Do gozo e da revolução que é nosso encontro. Pego o ônibus amanhã 6 da manhã, acredito que chego aí já de noite. Queria entrar voando pela sua janela. Deixa ela aberta pra eu conseguir entrar. Te amo. Te mando com essa carta alguns desenhos. Te sinto até me dissolver.
Zine anônimo, tá? Eu gosto do nosso anonimato, nos protege do fim do mundo. Gostei desse primeiro que você fez com ele. Já chego amor, deixa as cortinas abertas, sempre. Não continua se escondendo do sol, nem das noticias do dia. Vamos precisar atravessar tudo.
As bruxas se apaixonam?
Preciso aprender a ser mulher, mesmo que já esteja cansada demais. Agora gostei de ser menina, raio, gozo, planta, rio, bruxa, lingua, lágrimas negras e cachoeira de água fria pra entrar. Como revolucionária você tem que aprender a viver num tempo de catástrofes, amor.Desastres incontornáveis existem, mas sobretudo, existe o amor. E por isso estamos vivas.
Beijos da sua amada, R.