Paraíba-farol: Desfazendo Gênero

 

Paraíba-farol: Desfazendo Gênero

 

Por: Carlos Enrique Ruiz Ferreira

 

Não são poucos os faróis da Paraíba que iluminam o Brasil e o Mundo. Falta-nos apenas valorizar mais nossas produções, feitos, líderes e intelectuais que abrilhantam a sociedade. Valorizar as boas iniciativas torna-se cada dia mais difícil, já que vivemos num status quo marcado pelo déficit de generosidade e solidariedade, pela cultura egóica, do hiperconsumo, do fast food e do “sucesso” a qualquer preço. Muitas vezes “passamos” por Augusto dos Anjos, José Américo, Zé Lins do Rêgo, Chateaubriand, Celso Furtado e não nos damos conta das inovações tecnológicas, artísticas e políticas que empreenderam. De igual forma, custa-nos inserir nos currículos escolares as resistências das e dos indígenas Potiguaras, dos quilombolas, as lutas das mulheres, pela reforma agrária, das nossas Margaridas Alves, dos Pedros Teixeras, dos Negos Fuba e tantas outras.

 

Com uma literatura de cordel de qualidade artística ímpar (que nos lega o maior acervo de cordel do mundo, o Acervo que toma o nome do idiossincrático e brilhante Átila Almeida), com um gênero musical grandioso, que é o forró e suas variantes, com a energia e beleza das Rodas de Coco e dos terreiros de Jurema, a Paraíba avança em suas resistências. Que dirá dos músicos e músicas que aí estão a rodar e encantar o mundo.

 

Passado e presente: são muitos os faróis que iluminam. Lembram-nos a imagem do Farol de Cabo Branco mas que, com uma vez disse o Embaixador Celso Amorim (em nossas terras) bem poderia chamar-se “Cabo Negro”.

 

Outro farol para o país e para o mundo aparecerá em outubro, na rainha da Borborema, nossa querida Campina Grande. O terceiro seminário internacional Desfazendo Gênero diz em seu nome a que veio: “Com a diferença tecer a resistência”. (http://desfazendogenero.com/ ) Para nós, os nomes e as palavras importam: “com”, “diferença”, “resistência”, “tecer”. Por onde passo neste país deparo-me com a notoriedade e respeitabilidade do Seminário, que teve inicio em 2013, em Natal, teve sua segunda edição em Salvador, em 2015 (quando trouxe a expoente dos estudos de gênero, política e relações internacionais Judith Butler) e marcará nosso Estado com a terceira edição em Campina Grande.

Aqui se falará não apenas dos preconceitos, sexismos e racismos incrustados na cultura oficial, conservadora, da Casa Grande, mas também dos mecanismos mais sutis do que o peruano Haya de La Torre uma vez chamou (na década de 30) de “coloniaje metal”. Quais as estruturas coloniais, no tocante aos hábitos, desde os políticos institucionais, até os culturais, familiares, afetivos, que preservamos e reproduzimos em nossos corpos e mentes? Como descortinar esses processos? Como descolonizar o pensamento e os corpos que tanto avassalam e, por que não dizer, atrasam nosso desenvolvimento em termos de potencialidades subversivas do saber-fazer? E, para esta tarefa, trata-se de articular, intercambiar, construir pontes, não só na esfera acadêmica e universitária, mas com as e os ativistas, com aquelxs que estão na luta cotidiana, que tanto sofrem os estigmas e marcadores sociais mas que também produzem tecnologias sociais para sobreviver e para sublevar o sistema heteronormativo, homogeneizador e produtor e mantenedor de desigualdades.

 

Desta forma, o seminário também cumpre o papel fulcral da universidade – muitas vezes deixado em segundo plano – de estar em movimento e construir uma parceria direta com a sociedade civil. A Universidade, as produções de pesquisa, extensão e ensino, neste sentido, deve servir não só às Empresas e sua lógica produtivista, mas também à sociedade civil como um todo, às resistências sociais, aos combates das assimetrias históricas e contemporâneas, à descolonização das práticas e saberes.

 

O desfazendo gênero vem para desfazer mas vem também para tecer. Oxalá os diversos atores sociais, políticos e educacionais, estejam atentos, presentes e participem desse processo de envergadura considerável para o saber-fazer das insurgências do século XXI. É por aí, acreditamos muitos, na trilha dos pensamentos de Darcy Ribeiro, Glauber Rocha e Oswald de Andrade, que a Paraíba e o país pode dar seu verdadeiro salto de desenvolvimento. Aquele tão esperado, do Farol do mundo.